Resenha de Os Herdeiros dos Titãs – de lutas e ideais

“Os Herdeiros dos Titãs – de lutas e ideais” (Giostri, 2010, 350 páginas), do escritor e pesquisador brasileiro Eric Musashi, apresenta a jornada épica empreendida por pai e filho através do continente fantástico de Grabatal. Para o primeiro, Arion, esta jornada representa autoconhecimento e a descoberta de si mesmo. Para o segundo, Téoder, é a busca pela redenção por um terrível crime cometido e por uma culpa que consome sua própria alma.

Ao longo das 350 páginas do livro Eric Musashi nos apresenta a maravilhosa e complexa civilização que habita o continente de Grabatal. Sua virtuosa descrição dos costumes, tradições, religião, estrutura social e militar que compõe o cenário servem de pano de fundo para a história narrada.

Téoder vive em Catebete, a capital do continente e morada de Quetabel, a Deusa Rainha. Conhecido como o guerreiro mais poderoso de seu tempo, ocupa o cargo de béli, o principal lider político e militar dentro das cidades-estado.

Nas palavras do próprio autor, Téoder é o herói ideal que falhou e não soube como agir. Esta abordagem nos apresenta um homem infeliz e desconfortável com o rumo que sua vida seguiu, refém e amante da manipuladora Rainha e consumido pela terrível culpa por ter assassinado Faná, sua esposa e mãe de Arion. A motivação por trás deste terrível ato é um dos principais elementos presentes na trama deste primeiro livro.

Os Herdeiros de Titãs

Arion é um jovem e idealista que se rebela contra o regime do beli de Jatitã, antiga capital de reino de Atala. Sua insatisfação o conduz a um confronto de conseqüências trágicas e que marca o início de sua jornada pelo continente de Grabatal, juntamente com seu inseparável amigo Luredás.

Porém, Arion deixa um rastro de destruição por onde passa, e problemas o perseguem através de toda a sua trajetória ao longo de Grabatal e se agigantam de tal forma que ele se vê forçado a fazer algo impensável: recorrer a ajuda do assassino de sua mãe.

A história segue de forma paralela esta trajetória empreendida por pai e filho e culmina com o inevitável encontro entre os dois – porém o caminho percorrido por ambos os fez amadurecer, e o desfecho desta história não ocorre como o esperado.

Os Herdeiros dos Titãs estampa desde as suas primeiras páginas temas infreqüentes nos universos de fantasia: insatisfação social, questionamento do status quo político e religioso, e principalmente, a miséria e o sofrimento das pessoas comuns. Também descobrimos ao longo da história que algo de terrível está acontecendo em Grabatal. O clima mudou, grande parte da população passa fome e partes do próprio continente parecem estar morrendo.

Quetabel, a Deusa imortal, representa para mim um dos poucos pontos falhos em Os Herdeiros dos Titãs. A personagem é somente uma coadjuvante neste primeiro livro, mas é estranho ver uma mulher com mais de 700 anos e que ocupa o posto de Deusa Rainha agir como uma adolescente enciumada. Espero que no próximo livro, A Mão do Destino, a personagem seja aprofundada e descubramos mais sobre sua história e motivações.

Com um cenário que aguça a curiosidade do leitor por saber mais sobre a história e o destino de Grabatal, Os Herdeiros dos Titãs – de lutas e ideais é uma leitura altamente recomendada. A estrutura criada pelo autor é tão sólida e detalhada que, com algumas adaptações, poderia se transformar facilmente no cenário perfeito para um RPG.

Saiba mais sobre Os Herdeiros dos Titãs aqui.

Mapa - Os Herdeiros dos Titãs - O Nascente

Duna: O Inventor do Livro Holístico

Sinopse (por Aleph):

A vida do jovem Paul Atreides está prestes a mudar radicalmente. Após a visita de uma mulher misteriosa, ele é obrigado a deixar seu planeta natal para sobreviver ao ambiente árido e severo de Arrakis, o Planeta Deserto. Envolvido numa intrincada teia política e religiosa, Paul divide-se entre as obrigações de herdeiro e seu treinamento nas doutrinas secretas de uma antiga irmandade, que vê nele a esperança de realização de um plano urdido há séculos. Ecos de profecias ancestrais também o cercam entre os nativos de Arrakis. Seria ele o eleito que tornaria viáveis seus sonhos e planos ocultos?
Ao lado das trilogias ‘Fundação’, de Isaac Asimov, e ‘O Senhor dos Anéis’, de J. R. R. Tolkien, ‘Duna’ é considerada uma das maiores obras de fantasia e ficção científica de todos os tempos. Um premiado best-seller já levado às telas de cinema pelas mãos do consagrado diretor David Lynch.

Duna

Quando me deparei com as divagações do físico Fritjof Capra, busquei o significado do holismo por ele professado, e descobri que tem sua raiz em hol-, do grego, que significa “tudo”. O holismo, diferente do paradigma normal da ciência ocidental desde que foi inventado o método científico, busca analisar tudo em visão “panorâmica”, todos os pormenores e a correlação que leva a um resultado. Em comparação, se você está doente, um médico ocidental diagnostica e dá um comprimido. Um holístico procuraria, além disso, a raiz do problema e como evitar que se repetisse em sua vida.

Duna_nova-fronteiraDuna foi publicado por Frank Herbert em duas partes numa pulp após ter sido recusado por cerca de trinta editores. Um deles, profeticamente, comentou: “Posso estar cometendo o erro da década, mas…”. E ele cometeu. O livro não só foi revolucionário e bem aceito pelo público, como repetiu o sucesso na crítica e faturou os prêmios Hugo e Nebula, os principais da fantasia e ficção científica nos EUA. Não considero o livro apenas um marco na literatura, mas um clássico holístico antes mesmo do termo ser cunhado.
Confesso que não era interessado por ler ficção científica antes de Duna. Comprei o livro num sebo por R$ 5,00 em 2004 e, como estava escrevendo meu romance Os Herdeiros dos Titãs, emprestei-o. E, terminado o meu livro, comecei a ler.
Foi algo tão dramático que Duna simplesmente chutou o mega épico Musashi do topo da lista dos meus preferidos, e, ao lado da continuação-epílogo O Messias de Duna (Dune Messiah), nunca mais saiu de lá. A forma com que o autor escreve de maneira velada, mas apaixonando tanto o leitor que este se obriga a compreender cada termo usado e o impacto que ele causa, bem como os conceitos criados por Herbert, é única. Ao invés de encontrar robôs, batalhas de naves e supercomputadores, deparei-me com um enfoque no humano, em suas potencialidades, seus anseios e sua profundidade inexplorada. A cada página, o resultado foi uma satisfação e uma reflexão, geralmente resultando num aprendizado. Tudo em Duna é explorado e relevante para o curso dos acontecimentos: psicologia, sociedade, religião…
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Duna já foi transposto para as telas mais de uma vez, sendo uma delas no cinema, geralmente tendo um resultado insosso. A estória de Duna, por si só, é simples – já vi comparações com Robin Hood -, e talvez o erro tenha sido focar na narrativa. Não, não é em seu roteiro que Duna é original. E sim nos “planos dentro de planos dentro de planos” que permeiam as mentes de seus personagens, complexos e verossímeis; sim no uso de drogas para novos estados de consciência e compreensão de grandes verdades; sim no planeta desértico dos vermes de areia quilométricos; sim no poder político e social das crenças.

Mesmo não contendo longas descrições, Herbert consegue envolver o leitor de tal modo que surgem ao seu redor as paisagens das dunas de areia de Arrakis, e ele sente a boca seca e o desconforto do traje-destilador. Mais do que isso: toda aquela privação consegue se tornar apaixonante, de modo que é impossível se pensar em deserto sem uma certa nostalgia após a leitura do livro.

A série foi lançada no Brasil pela editora Nova Fronteira, mas está esgotado e não há reimpressões. Mas, para a felicidade geral da nação, a Aleph republicou o primeiro livro recentemente. Uma sugestão: prepare-se para uma corrida aos sebos, pois será impossível se contentar com o primeiro livro. Ou então faça sua prece a Shai-Hulud para que a Aleph publique os outros!